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domingo, 25 de dezembro de 2011

A Usura, ontem como hoje


                                    "quem distingue ou separa as 'éticas' numa 'ética para a vida', uma ´'ética para os negócios', uma                                         'ética para a profissão', acaba, irremediavelmente, por nem ter nem praticar ética nenhuma". Zef,VR
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Hilaire Belloc, “Sobre a usura”:
"(…) os juros sobre um empréstimo podem constituir, sob certas circunstâncias de tempo ou extensão, uma exigência de tributação impossível. Podem representar em determinado contexto um tributo moralmente indevido, que não traduz produção extra de riquezas gerada pelo investimento original. Sob certas condições, os valores exigidos não equivalem mais o fruto do investimento original, não correspondendo, portanto, à remuneração de parte dos lucros, mas sim a um pagamento a ser feito, se possível, a partir de quaisquer outros bens que o devedor possa obter. E esse tributo, além de certo ponto, torna-se mesmo impagável, devido à inexistência na sociedade dos meios suficientes para tanto.

Que circunstâncias são essas? Que condições distinguem a exigência de juros moralmente legítima da ilegítima?

A distinção se dá entre a cobrança moral de parte dos frutos de um empréstimo produtivo e a exigência imoral de juros sobre um empréstimo improdutivo ou juros superiores ao incremento anual em riquezas efetivas geradas por um empréstimo produtivo. Tal exigência “esgota” – “consome” – “exaure” as riquezas do devedor, sendo por isso denominada “Usura”. Uma derivação imprecisa em termos filológicos, mas correta sob o ponto de vista moral, conecta o termo latino “usura” à ideia de destruir, “exaurir”, e não à idéia original do termo “usus,” “uso”.

A Usura, portanto, é a cobrança de juros sobre um empréstimo improdutivo ou de juros superiores ao incremento real gerado por um empréstimo produtivo. É a exigência de algo ao qual o credor não tem direito, como se eu dissesse: “Pague-me dez sacas de trigo ao ano pelo aluguel destes campos”, após os campos terem sido tragados pelo mar ou terem passado a produzir anualmente muito menos do que as dez sacas de trigo.(...)"


ver mais:

- "Pecado de usura"
- "Sobre e contra a Usura"

- A Usura e o "Justo Preço"

- CANTO XLV - With Usura

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www.galeon.com/projetochronos:
"O Concílio de Viena de 1331 autorizou os tribunais da Inquisição a perseguir os cristãos que praticassem a usura. Note-se que a determinação não menciona se são cristãos novos ou velhos, abrangendo a todos que professem, forçosamente ou não, a fé católica. Com isso a igreja conseguiu livre arbítrio para setenciar á morte um usurário e ainda ficar com seus bens em troca da salvação de sua alma. (...)

A palavra usura, em seu sentido atual, significa a cobrança de juros exorbitantes. Mas, no tempo medieval e mesmo no século XV, chamava-se usura a cobrança de juros de qualquer espécie ou como define Le Goff, a usura é um valor imposto  sobre o poder aquisitivo, sem relação com a produção, freqüentemente mesmo sem relação com as possibilidades de produção.


O que se percebe é que havia uma preocupação, por parte da igreja católica, em colocar os negócios do povo hebreu em uma escala inferior em detrimento da ação dos usurários cristãos. No entanto, por mais que a igreja e a política vigente se esforçasse para conter a ação judaica, nada a impedia, tanto que, na França, no século XIII, Felipe, o Belo, expulsa os judeus de seu território, deixando, lamentações, por parte de quem se viu obrigado a negociar com os usurários cristãos. Tal tristeza é expressa em um poema, que se lamenta dizendo:
Toda gente pobre se queixa
Pois os judeus foram muito mais bondosos
Ao fazer seus negócios
Do que o são agora os cristãos
Pedem garantias e vínculos
Pedem penhores e tudo estorquem
A todos despojando e esfolando…  
Mas se os judeus  
Permanecessem no reino da França, 
Os cristãos teriam tido
Muito grande ajuda, que agora
Não tem mais. (século XIII)"
 
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Com Usura (por EZRA POUND)

"Com usura
nenhum homem tem casa de boa pedrablocos lisos e certosque o desenho possa cobrir;
com usura
nenhum homem tem um paraíso
pintado na parede de sua igreja

com usura
(...)
nenhum quadro é feito para durar e viver conosco,
mas para vender, vender depressa;
com usura, pecado contra a natureza,
teu pão é mais e mais feito de panos podres
teu pão é um papel seco,
sem trigo do monte, sem farinha pura (...)"

EZRA POUND

sábado, 3 de dezembro de 2011

Judicatus I (o estado comatoso das "partes")

PROCIDADE

Se a Justiça é do Povo e para o Povo, porque a consideram sua e só sua os pares judiciais/judiciários?

Porque é que na administração da justiça os pares judiciários colocam o Povo (as partes) fora do seu círculo fechado e falando Dele (delas) na terceira pessoa?...


Sabe-se como e quando começou esta expropriação da justiça, o que se não compreende é que esta se mantenha - diria mais, que até se venha agravando - 40 anos depois de implantados Democracia e Estado de Direito e quando dizem termos uma Democracia madura (!).

Se no movimento - ou impulso - da Sociedade para os tribunais a hierarquia funcional deve ser do Povo (e seus mandatários Judiciais) para a Judicatura; se no movimento - ou impulso - dos Tribunais para a Sociedade,  deve ser  da Judicatura para o Povo (e seus mandatários judiciais), porque é que afinal acaba por ser sempre dos Mandatários/Advogados para a Judicatura e da Judicatura Para os Mandatários/Advogados, tratando as partes como inabilitados ou incapazes tutelados?...
... e com informação (ou conhecimento) tantas vezes insuficiente, imperfeito, tardio ou até inexistente [1]?

Se nem num Hospital - a menos que inconsciente ou em coma - um paciente deixa de ser perguntado, consultado e informado sobre o que lhe diz respeito e independentemente de quem o representa (e convenhamos que saber de medicina é bem mais difícil que saber de factos e de direitos do senso comum), porque é que nos tribunais, médicos, enfermeiros, auxiliares e demais pares forenses ignoram o Povo (e os sujeitos da acção) e o mantêm de fora do processo, ignorando-o ostensivamente como se não estivesse presente ou como se estivesse em coma profundo?...

Porque é que na administração da justiça os pares judiciários deixam o Povo (as partes) de fora do seu círculo fechado e falando Dele (delas) na terceira pessoa?...

Afinal, quem é a primeira pessoa?...

Com honrosa excepção dos Juízes do Tribunal de Trabalho, quando partes e mandatários estão na Lota Judiciária (porque outro nome se não pode dar àquilo em que se transformam as zonas de chamada e espera dos tribunais numa organização judiciária que persiste em marcar todos os julgamento para a mesma hora), é frequente os/as Senhores/as Juízes chamarem ao seu gabinete os/as mandatários/as para conferenciarem ou para uma espécie de pré-julgamento onde se pergunta se há evolução possível para um acordo, onde se vai ao ponto de dar umas notas sobre a dificuldade do Sr Advogado do A em provar o quesito X e Y e do Sr Advogado do R para elidir o quesito Z e se insiste para que vão "lá fora" falar com os respectivos clientes e convencê-los para um acordo, etc[2]. ao mesmo tempo que ficam cá fora, como inimputáveis em em paralisia cerebral, as partes!...

Mas que indignidade é esta com que se tratam adultos, quando nem uma professora deve falar ao/à encarregado/a de educação de um/a aluno/o criança sem que este esteja presente?...

E sendo - e ainda bem - os/as Juízes pais e encarregados de educação e diante deles os seus filhos, crianças, adolescentes, jovens, são tratados com dignidade e respeito pela sua identidade e personalidade, como são capazes de levar tais práticas para os Tribunais e assim tratar o Povo Soberano?...

Por outro lado, com que transparência, legitimidade e respeito pelas DLG e pela Democracia se age assim; afinal para quem é a justiça que ali foi demandada e em nome de quem a fazem os/as Srs/as magistrados judiciais?

Que dimensão de Dignidade Jurídica se edifica e mantém, por um lado, e por outro, não sendo a Justiça, como já vimos dizendo, coisa diferente da percepção que dela tem o Povo,  que percepção e perspectiva se espera que este tenha de uma justiça assim administrada?

E até a bem de maior eficiência funcional, porque é que se avistam, conferenciam, entrevistam e entre-vêem tanto (e tantas vezes) os magistrados com os advogados e tão pouco - ou nada! - com as partes ou com as partes?
Alegando-se que também tem a administração da justiça fins pedagógicos, como sanar esta omissão e esta contradição?

Estará mesmo expresso nos Códigos de Processo que assim se deve agir no Tribunal?

Se está, está mal, não pode ser constitucional. E o/a Juiz, a bem da dignidade do Povo que integra e em nome do qual julga, deveria a) desobedecer invocando a inconstitucionalidade,  b) recorrer oficiosamente em conformidade. Mas se não está assim plasmado nos ditos códigos, se não é assim que mandam agir ou se até são omissos nessa matéria, a questão é bastante mais séria: 
- Se 40 anos depois do 25 de Abril, quando já não está em exercício rigorosamente nenhum dos magistrados que o foram no velho Estado Novo, estas práticas do corporativismo subsistem, quantas gerações mais seriam/serão necessárias para erradicar um tal arquétipo e fazer fluir nos tribunais uma cultura democrática??? 

[1]Zctrr-VM-B; CSV-4JCB;


[2] - esta excessiva e não desejável liberdade de abordagem à casuística vai ao ponto de já na sala e para um julgamento no processo A, antes de sentar e assentar e porque coincidem advogado e juiz  num processo B em curso e com julgamento à vista, podem até cruzar conversa sobre o assunto diante dos sujeitos da acção do caso A (caso verídico);

[3] - ou, pior ainda em avistamentos avulsos no gabinete do/a Sr/a Juiz este/a fazer lobbing contra um cliente do advogado, não tendo aquele cometido qualquer ilícito e sendo pessoa de bem, mas porque ousou criticar atitudes do/a Sr/a Juiz : Oh Shor Doutor, o Senhor ainda representa aquele tipo?... nem sei como é que o Sr ainda o representa (caso verídico)":

[4] - a excepções discricionárias, discriminatórias e classistas em favor de uma das partes quando a representante é por exemplo, uma Sra Doutora Gestora (caso verídico).

Porque nos foi entretanto solicitada a explicação da legenda, dentro dos tribunais, o patinho feio é o amarelo, o único que não veste nem toga nem beca negras...

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

O "Pranto de Maria Parda" (Gil Vicente)

PROCIDADE
"É um gesto primário de oportunismo [1] (...) dissimular uma relação afectiva (...) unicamente porque não se tem coragem para assumir as consequências políticas de opções que permitiram que essa relação pessoal se misturasse com o exercício de funções de estado (...)"


Marinho Pinto, 23Nov2011
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[1] - e de absoluta falta de caracter, acrescentamos nós ou, como disse em devido tempo F. Louçã, "esta gente tem a espinha dorsal de um caracol"...

"A Sra ministra da justiça envergonha-se do amor...

A ministra da Justiça

Publicado às 00.36

Depois de andar a acusar-me de lhe dirigir ataques pessoais, a sra. ministra da Justiça veio agora responder à denúncia que eu fiz de ter usado o cargo para favorecer o seu cunhado, Dr. João Correia.

Diz ela que não tem cunhado nenhum e que isso até se pode demonstrar com uma certidão do registo civil. Já antes, com o mesmo fito, membros do seu gabinete haviam dito à imprensa que ela é divorciada.

Podia explicar as coisas recorrendo à explícita linguagem popular ou até à fria terminologia jurídica que têm termos bem rigorosos para caracterizar a situação. Vou fazê-lo, porém, com a linguagem própria dos meus princípios e convicções sem deslizar para os terrenos eticamente movediços em que a sra. ministra se refugia.

A base moral da família não está no casamento, seja enquanto sacramento ministrado por um sacerdote, seja enquanto contrato jurídico homologado por um funcionário público. A base moral da família está na força dos sentimentos que unem os seus membros. Está na intensidade dos afectos recíprocos que levam duas pessoas a darem as mãos para procurarem juntas a felicidade; que levam duas pessoas a estabelecerem entre si um pacto de vida comum, ou seja, uma comunhão de propósitos existenciais através da qual, juntos, se realizam como seres humanos.

Através dessa comunhão elas buscam em conjunto a felicidade, partilhando os momentos mais marcantes das suas vidas, nomeadamente, as adversidades, as tristezas, as alegrias, os triunfos, os fracassos, os prazeres e, naturalmente, a sexualidade.


O casamento, quando existe, agrega tudo isso numa síntese institucional que, muitas vezes, já nada tem a ver com sentimentos, mas tão só com meras conveniências sociais, morais, económicas ou políticas.

Por isso, para mim, cunhados são os irmãos das pessoas que, por força de afectos recíprocos, partilham entre si, de forma duradoura, dimensões relevantes das suas vidas.

É um gesto primário de oportunismo invocar a ausência do casamento para dissimular uma relação afectiva em que se partilham dimensões fundamentais da existência, unicamente porque não se tem coragem para assumir as consequências políticas de opções que permitiram que essa relação pessoal se misturasse com o exercício de funções de estado, chegando, inclusivamente, ao ponto de influenciar decisões de grande relevância política.

Tal como o crime de violência doméstica pode ocorrer entre não casados também não é necessário o casamento para haver nepotismo.

Basta utilizarmos os cargos públicos para favorecermos as pessoas com quem temos relações afectivas ou os seus familiares. Aliás, é, justamente, aí que o nepotismo e o compadrio são mais perniciosos, quer porque são mais intensos os afectos que o podem propiciar (diminuindo as resistências morais do autor), quer porque pode ser mais facilmente dissimulado do que no casamento, pois raramente essas relações são conhecidas do público.

Aqui chegados reitero todas as acusações de nepotismo e favorecimento de familiares que fiz à Sra. Ministra da Justiça. Mas acuso-a também de tentar esconder uma relação afectiva, unicamente porque não tem coragem de assumir as consequências políticas de decisões que favoreceram o seu cunhado, ou seja o irmão da pessoa com quem ela estabeleceu essa relação.


Acuso publicamente a Sra. Ministra de tentar tapar o sol com a peneira, procurando dissimular uma situação de nepotismo com a invocação de inexistência de casamento, ou seja, refugiando-se nos estereótipos de uma moralidade retrógrada e decadente.

A sra. ministra da Justiça tem o dever republicano de explicar ao país por que é que nomeou o seu cunhado, dr. João Correia, para tarefas no seu ministério, bem como cerca de 15 pessoas mais, todas da confiança exclusiva dele, nomeadamente, amigos, antigos colaboradores e sócios da sua sociedade de advogados.

Isso não é uma questão da vida pessoal da Sra. Ministra.

É uma questão de estado.

Nota: Desorientada no labirinto das suas contradições, a sra. ministra da Justiça mandou o seu chefe de gabinete atacar-me publicamente, o que ele, obediente, logo fez, mas em termos, no mínimo, institucionalmente incorrectos.

É óbvio que não respondo aos subalternos da sra. ministra, por muito que eles se ponham em bicos de pés."
Marinho Pinto, 23Nov2011



O que Marinho Pinto não disse, porque tem outra estrutura moral além de, porventura, não ter querido ser politicamente incorrecto:

- Aquilo que a visada sente que tem, ou teme ter, ou não consegue senão ter, será mesmo um  "amante", nessa preconceituosa acepção de coisa pecaminosa, clandestina e concupiscente que o termo foi CONTRAÍNDO E MANTENDO ao longo dos tempos e que, infelizmente, ainda parece MANTER.

Considerando brilhante e ecuménica (sem ironia!) a definição que faz Marinho Pinto das relações afectivas e familiares, julgo devermos ter a ousadia de lhe dizer: - Prezado António, filho, pai, cunhado, tio, primo, irmão, companheiro, o que a Senhora visada terá, fazendo jus à mentalidade todo-o-terreno / todo-o-consumo (cif. Eurico Tiago in CM) iniciada nos tempos áureos da maioria anibalesca), é um desenrasque. Não tem afectos, antes rói uns ócios nas horas do osso ou uns ossos nas horas do ócioMas numa coisa estamos de acordo, é preço a mais para o homem do talho e para a sua parentela, sobretudo se pago pelo erário público!

Procidade

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Ad-Vocatus II: Os "estágios"


PROCIDADE
Dizia ontem Rogério Alves (Advogado e Ex-Bastonário da O.A.) que terá dito recentemente Marinho Pinto (actual Bastonário) ser desagradável e escusado referir e sublinhar a palavra "Advogado" sempre que se refere o caso em que é acusado no Brasil o Advogado Duarte Lima. Tem rezão em sentido geral e teria no caso particular de Duarte Lima, não fora decorrerem os factos que lhe são imputados do exercício dessa profissão e no gozo desse (muito especial) estatuto. Entretanto, na data de ontem conheceu-se mais uma série de ocorrências, suspeitas, investigações e detenções em torno de factos gravosos envolvendo o mesmo Duarte Lima e, de uma só penada, pelo menos mais quatro advogados, nessa qualidade, designadamente, os três advogados que na qualidade de procuradores foram parte nos negócios dos terrenos e nos quais se teme possa ter ocorrido uma burla que a confirmar-se, além desses contornos de burla, abuso de confiança e infidelidade, etc., seria ainda um acto de arrepiante insensibilidade humana e social social, e ainda o próprio defensor de Duarte Lima neste processo, de quem se diz na imprensa de hoje que terá suprimido páginas no processo, num incidente que envolve a queda de uma Sra Funcionária Judicial nas escadas. Em resumo - e deixando de fora a acusação que tramita no Brasil - só em torno desta questão BPN e dos tais terrenos, são referidos (pelo menos e por agora)  5 advogados, uns por supostos ilícitos, outros coisas de menor monta, mas todos praticados no (e desde o) exercício dessa profissão, advocacia.

Ainda antes de perguntar se são mesmo os cidadãos, as anedotas, ou os cartonistas de hoje, ontem ou anteontem os detractores do Advogados e da Advocacia, ou se são afinal os próprios advogados, impõem-se outras perguntas, porventura mais pertinentes:

-  Mas algúem  acredita que isto decorre de meros erros de casting à entrada para a faculdade?...
- Ou alguém duvida de que os jovens que entram em direito são iguais aos que entram em engenharia de polímeros, informática de gestão, enfermagem, sociologia ou qualquer outro curso superior?...
-  Sequer alguém acredita que é o curso em si mesmo que é desviante?...
- Então o que é que se passa, onde e quando, sendo certo que os onde e quando ocorrem obrigatoriamente após - e não durante - a faculdade?...

- Sendo certo que a) quem acaba o curso de direito não é mais de que um jurista licenciado, b) que os vários ciclos escolares até ao termo da faculdade formam moral e eticamente o cidadão,  c) que a formação para a ética e deontologia profissionais ocorre sobretudo no estágio...
- quem selecciona os "Patronos" e quem escrutina os "estágios", isto é onde, como e com quem se formam os advogados?...


Quem já não ouviu falar da elevada quantidade de jovens que uma vez encontrado patrono e iniciado o estágio, pouco depois o abandonam e deitam definitivamente fora a carreira da advocacia?

É que nem todos os estagiários têm a sorte ou a felicidade de encontrar um patrono e um escritório onde, por um lado, o advogado estagie e tirocine para ser tecnicamente bom enquanto causídico e trabalhe na observância de que, citando Artur Marques, "(...) a verdade é aquilo que cliente diz, mesmo que eu não saiba se o que - o cliente - diz é verdade ou não (...) ter como profissional a tal "postura de um médico, tratar da história dele - cliente - do ponto de vista jurídico - sendo - as histórias as que - os clientes - contam, e partir do princípio que aquilo que contam é verdade (...) mas mantendo a integridade moral e ser "(...) incapaz de retocar ou inventar a história (...)", e os que não têm esta sorte podem não ter estômago para um estágio onde terão que sacrificar estes e outros valores que se sobrepõem à boa litigância e à prossecução de uma justiça justa.

Sabendo que há, neste âmbito muito bons e muito maus advogados e que os maus têm no mínimo tantos estagiários como os bons, quem pode acreditar que saia boa a cozedura de um mau forno e que saiam bons os advogados de um estágio mau?...

De onde senão (também) de um mau estágio pode provir essa arrogância de alguns advogados - muitos, ao que parece e infelizmente - que os leva a acreditar poderem agir (e a agir!) como se tivessem um vasto plafond de iniquidade ou como se todos os seus actos, em qualquer lugar ou circunstância, estivessem abrigados pelos mesmos princípios que abrigam os juízes em estrita sede de processo judicial, os princípio da irresponsabilidade e da inimputabilidade?

Procidade

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Uma dramática ''Exoneração do Passivo Restante''

PROCIDADE
"O dinheiro, propriamente dito, é muito importante sobretudo para quem não tem mais nada p'ra ter"
Anónimo
Não se trata de tentar uma abordagem sociológica ou psicológica ao suicídio (ou sequer filosófica ou religiosa!), porque nem seria, por um lado, o local, nem, por outro, reuniríamos as condições. Além disso, desde - pelo menos - Durkheim, não faltarão estudos profundos e bem sustentados ao cídio de sui. Pretendemos abordá-lo, sim, enquanto matéria de responsabilidade social, e da moral social. Tal como as empresas na economia real, todos nós precisamos de movimentar na nossa contabilidade pessoal a quantidade suficiente, ou pelo menos, mínima, de capitais alheios para poder compensar o contínuo e inevitável movimento de contracção - expansão - contracção dos capitais próprios, e poder ainda assim  dispor do suficiente cash flow na vivência quotidiana.

É cada vez maior o número de pessoas que, tornando-se auto-Administradores da sua Insolvência pessoal, a decretam e executam enquanto olham para um balanço empobrecido de companhia, integração, proximidade, relações e afectos, não sendo possível que nos não sintamos responsáveis e nos não perguntemos, mas quem, de entre nós e contra mim falando,  viveu em indiferente "inadimplência" afectiva para com este "insolvente", quem de entre nós - e contra mim falando - lhe cobrou os "créditos" com excessivas exactoria ou prontidão?...
E sendo certo que em muitas situações, afinal, não existe até grande desequilíbrio entre activos e passivos, onde estava eu, que bem poderia ter ajudado a fazer uma melhor interpretação dos "balanços" e das demais peças contabilísticas?...

E não me pergunte, (acidental) leitor/a, o que é que neste breve texto é metafórico ou literal, porque o sofrimento, sendo contabilizavel nos passivos, é activo, é real, não é metaforico e, não o sendo, somos todos literalmente responsáveis enquanto pares sociais, seja no exercício das (e desde as) relações institucionais, das profissionais, das sociais ou até das familiares. Somos todos agentes a tempo inteiro da única economia de mercado digna desse estatuto superlativo, a vida em sociedade. E somos todos moral e socialmente responsáveis sempre que um dos nosso pares decide exonerar-se do seu (seja real ou apenas suposto) passivo restante.

Velha Humanitas

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Formosos e luminescentes


PROCIDADE
Em menos de duas décadas conhecemos quase meia dúzia de logótipos à EDP (e sem considerar a REN e outras empresas do grupo). Tanto esmero nas toalhas para nos servir sempre e desde sempre o mesmo mal servido e abusivo prato.


          Esta entidade que, para lograr os seus chorudos dividendos, não só se apropriou dos recursos dos meios e até da alma e da história das gentes [1] e [2], dispondo à vontade do que só ao Povo,  usando e dispondo arbitrariamente do que sendo de todos e a todos pertence a todos deveria beneficiar por igual. Usa e abusa em seu estrito proveito dos 4 elementos, dando o pior, mais abusivo e mais egocêntrico uso a tais recursos, transformando-nos os rios em charcos e poças, invadindo montes e vales com os seus sinistros postes e fustigando-nos o céu mais próximo com os mesmos longos e sinistros molhos de cabos; represa a água para ciclicamente a despeja sobre a vida das pessoas, inundando-nos e alagando-nos as estradas, os campos, as casas, a nossa vida, a própria alma; que nos polui montes e colinas e paisagens com papagaios e ventoinhas de papel em tamanho gigantesco. E que nos devendo fornecer a energia nas condições de ética e de reciprocidade exigível a quem usa e dispõem do que é nosso, nos factura em papeis sucessivamente  neo-logotipados a "luz" (seja isso o que for) e mais taxas, e sobretaxas, e outros tantos impostos travestidos. Esta empresa, enfim, que devendo responder com uma ética de obrigações e solidariedade às dificuldades dos verdadeiros donos e proprietários dos bens e meios de que dispõe, paradoxalmente, é nesta altura de crise e pobreza crescente que, demonstrando os mais gritantes insensibilidade, indiferença, egoísmo e falta de respeito, reduz de três meses para três semanas o tempo em que corta o fornecimento de energia pela falta de pagamento(!).

           Em contrapartida, além das fortunas que despende com os seus Bureaus de administração e direcção, gasta ostensivas e despudoradas fortunas em anúncios televisivos tão longos quanto inúteis (não tendo concorrência, apenas precisa de se “distinguir” de concorrentes ficcionados e ou alienígenas) e ainda com estes caríssimos desenhinhos do capítulo da “imagem e comunicação”, assim nos dando a exacta noção de que além da sua voracidade predadora primária, nada mais tem de perene ou duradouro, tudo é para inglês ver, tudo é de usar e deitar fora, tudo é expelido após o escasso hiato entre a ingestão e a digestão, lembrando-nos inevitavelmente o fragmento do célebre poema do Abade de Jazente (1719-1789)[3]  que o próprio Bocage mais tarde glosaria[4]: “(…) que deitando no mês podre gordura / fétido mijo lança a qualquer hora / Caga o cu mais alvo merda pura /pois se é isto o que tanto se namora / em ti mijo, em ti cago, oh formosura!  

[1] Em 1971 sobremergia uma povoação comunitária inteira, Vilarinho das Furnas, possivelmente um dos maiores afogamentos colectivos da história,
"No dia seguinte só havia silêncio...<> era a frase que verbalizava o receio de desaparecimento da aldeia nos anos que antecederam o enchimento da albufeira. A "presa" começou a ser uma realidade cada vez mais próxima, até que, em 1971, foi preciso meter toda a aldeia em carrinhas e tirá-la dali. A diáspora de Vilarinho espalhou-se por vários concelhos do Norte e pela emigração, mas alguns moradores ficaram a viver ali perto, na povoação vizinha de S. João do Campo(...)"
[2] prática que vai ciclicamente reiterando, assim tendo levado para a memória submersa outras aldeias e populações, como a aldeia da Várzea e muitas outras;
[3] -  Abade de Jazente
"Paulino António Cabral (Amarante, 6 de Maio de 1719 — 20 de Novembro de 1789), melhor conhecido por Abade de Jazente, foi um poeta português. Estudou Direito Canónico em Coimbra a partir de 1735 e licenciou-se em 1741. Foi nomeado abade de Jazente em 1752. Além de religioso, escreveu poesias.
É personagem do romance histórico Um motim de há cem anos, de Arnaldo Gama.
Obras
- Poesias de Paulino Cabral de Vasconcelos, Abade de Jazente, vol. I (Porto, 1786)
- Poesias de Paulino António Cabral, vol. II (Porto, 1787).
e
por Balbino de Carvalho, Paulino António Amaral (Um poeta amarantino do século XVIII), Martins & Irmão Lda., Porto, 1955"...

Soneto II
"Piolhos cria o cabelo mais dourado;
branca remela o olho mais vistoso;
pelo nariz do rosto mais formoso
o monco se divisa pendurado:

Pela boca do rosto mais corado
hálito sai, às vezes bem ascoroso;
a mais nevada mão é sempre forçoso
que de sua dona o cu tenha tocado;

Ao pé dele a melhor natura mora,
que deitando no mês podre gordura,
fétido mijo lança a qualquer hora:

Caga o cu mais alvo merda pura:
pois se é isto o que tanto se namora,
em ti mijo, em ti cago, oh formosura!"



[4] -  Barboza du Bocage
Cagando estava a dama mais formosa,
E nunca se viu cu de tanta alvura;
Porem o ver cagar a formosura
Mette nojo à vontade mais gulosa!
Ella a massa expulsou fedentinosa
Com algum custo, porque estava dura;
Uma charta d'amor de alimpadura
Serviu àquella parte malcheirosa:
Ora mandem à moça mais bonita
Um escripto d'amor que lisonjeiro
Affectos move, corações incita:
Para o ir ver servir de reposteiro
À porta, onde o fedor, e a trampa habita,
Do sombrio palacio do alcatreiro!



sábado, 30 de julho de 2011

Quem os trava, quem os leva a tribunal???

 "USO&aABUSO"
“[...] a liberdade bancária – por uma errada aplicação da força especulativa, por um desvio originado na cobiça natural; desvio que a lei consente por abandonar à anarquia a organização do serviço de crédito, por o tornar dependente de uma especulação que, posta ao abrigo da ruína do crédito pessoal por meio do limite da responsabilidade, se torna desde logo em vertigem de empresas de jogo, e afinal de roubos [...] a agiotagem provocada por uma legislação excessivamente livre[…] capitalização excessiva por parte do Governo, que excedeu o que as forças económicas do país comportavam”…
Oliveira Martins - 1877

                                    "quem distingue ou separa as 'éticas' numa 'ética para a vida', uma ´'ética para os negócios', uma                                         'ética para a profissão', acaba, irremediavelmente, por nem ter nem praticar ética nenhuma". Zef,VR
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O presidente da Caixa Geral de Depósitos considera que as autoridades europeia devem reagir ao "ataque" da Moody's. Faria de Oliveira: descida do rating "é imoral e insultuosa"
06/07/2011 | 07:17 | Dinheiro Vivo
O presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD) considera “imoral e insultuosa” a descida do ‘rating’ de Portugal anunciada na terça-feira pela agência de notação financeira Moody’s..."
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Faria de Oliveira ganha por ano na CGD uns módicos e moralmente aplaudíveis 372 mil euros/ano, antes de prémios e comissões...
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Desabafo de um reformado com uma reforma inferior a 500 euros após quase 50 anos de trabalho e de descontos. "O Salazar lá sabia tinha estes democratas na cadeia"...
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...temos pena, não nos lembramos do que sugeriu o Otelo quando regressou da sua visita a Cuba nos anos 70. De todo em todo, bastaria a cadeia. A de Salazar ou outra...

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Quem põe cobro nestes roubos, nestas extorsões em massa, quem os leva a tribunal???



domingo, 24 de julho de 2011

"É imoral e insultuoso" diz esta referência moral que preside à CGD

PROCIDADE

                                    "quem distingue ou separa as 'éticas' numa 'ética para a vida', uma ´'ética para os negócios', uma                                         'ética para a profissão', acaba, irremediavelmente, por nem ter nem praticar ética nenhuma". Zef,VR
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06/07/2011 | 07:17 | Dinheiro Vivo
O presidente da Caixa Geral de Depósitos (CGD) considera “imoral e insultuosa” a descida do ‘rating’ de Portugal anunciada na terça-feira pela agência de notação financeira Moody’s..."
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que interessante, isto diz Faria de Oliveira que ganha por ano na CGD uns módicos e moralmente aplaudíveis 372 mil euros/ano, antes de prémios e comissões...
i.e., ganha só num ano - e antes de prémios, comissões e mais a futura reforma, tanto como ganhará em 45 anos consecutivos de trabalho um carpinteiro ou uma costureira...
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Num esquema propagandístico que faria inveja a certos regimes do passado, diz diz a Catarina sobre o que na verdade nos vai sendo... Furtado, que na caixa os benefícios crescem à medida que aprofunda o seu relacionamento com o Banco
e o que diz é a mais pura verdade, se falamos dos benefícios da Caixa e dos daqueles que para a mesma são nomeados. Aliás, bem poderia a Catarina dizer que”na caixa os benefícios crescem à medida que aprofundamos o nosso relacionamento com a sua conta”.
Mas para o titular da conta, não é verdade, bem pelo contrário: analisamos dois anos do extracto de conta de um estudante universitário e ficamos bem esclarecidos sobre os benefícios, quem beneficia e como e até onde pode chegar o aprofundamento do banco: nem as perfuradoras petrolíferas se mostrariam tão eficientes...

Sabendo-se que o dinheiro que cada pequeno depositante tem na sua conta à ordem é integrado numa série de instrumentos de “dinheiro desmaterializado” e eficazmente “aplicado” pelo banco numa pluralíssima série de operações de curtíssimo prazo e em seu (dele, banco) estrito benefício, é escandaloso e ultrajante como não só não reparta esses benefícios com os pequenos depositantes como ainda os tribute e puna quando impedem o banco de extrair esses mesmos lucxros a seu gosto e bel-prazer.


 Realizadas no regime de “Overnight”e assim fazendo jus à máxima que diz que “os negócios da noite são os que dão mais dinheiro”, quando por cá é noite e madrugada (ou dia e hora não útil para o banco), até em feijão e costeletas de porco ossadas e desossadas o banco investe esses saldos,  retirando dessa especulação chorudos proventos que não são para distribuir pelos clientes, mas sim pelo larguíssimo corpo de administradores e directores. É por isso que esta banca precisa que se aprofunde o relacionamento. Estes pequenos saldos do mosaico social que compõe as contas da CGD é tão ou mais valioso que a garimpa aurífera para o contratador dos garimpeiros: Que os estudantes, os reformados, a camada mais baixa do funcionalismo público, isto é, os mais pobres, lá deixem o seu parco dinheiro “à ordem” dela CGD, para esta investir, fundear, especular. Em paga, não só não dão, como aprofundam o comissionamento ao ponto de se cobrarem pela mais insignificante operação de uma comissão igual ou superior a 10% de um salário mínimo nacional. Por uma operação que dá menos trabalho e despesa que servir um café numa cafetaria!!!

Ao abrigo do tal preçário de 110 páginas que, supostamente, o cliente deve conhecer antes e que, afinal, nem os próprios funcionários conhecem... depois!

Na altura das graves crises financeiras (mormente a de 1876) no seio das quais nasceu a própria CGD, escrevia assim Oliveira Martins (DG de 28 Fev 1877):

“[...] a liberdade bancária – por uma errada aplicação da força especulativa, por um desvio originado na cobiça natural; desvio que a lei consente por abandonar à anarquia a organização do serviço de crédito, por o tornar dependente de uma especulação que, posta ao abrigo da ruína do crédito pessoal por meio do limite da responsabilidade, se torna desde logo em vertigem de empresas de jogo, e afinal de roubos [...] a agiotagem provocada por uma legislação excessivamente livre[…] capitalização excessiva por parte do Governo, que excedeu o que as forças económicas do país comportavam”…

Nesta altura já existia o Banco de Portugal mas não era estritamente regulador, antes concorria com os restantes bancos e casas bancárias.

Cento e trinta anos volvidos, o Banco de Portugal é estritamente regulador. E o que faz, o que regula, o que é que é diferente hoje em termos de especulação e “vertigens de casa de jogo e roubo op.cit) ”?...

E que moral e ética pratica hoje a CGD, que cultura financeira e responsável pratica o Banco que nasceu para equilibrar/ou sanar quer as más práticas e o quer o estado de coisas de há 130 anos?

Que responsabilidade histórica demonstra?...

Há semanas, o Presidente Faria da CGD, o “dono da cadeira”, patrão de directores e feitores continuamente nomeados e remunerados, modicamente remunerado com uns moralmente aplaudíveis 370 mil euros ano antes de prémios e comissões,  denunciava que o corte de rating da Moody’s como imoral e insultuosa.

Esta ordem não é gratuita, de facto antes da própria Lei há outra ordem de normas que rege a sociedade, as pessoas entidades e instituições, incluindo as bancárias: a moral. E segundo o presidente da CGD, atribuir uma dada classificação pode ser imoral ou insultuoso.

Mas nada encontra ou revela de censurável nas práticas da CGD quando em duas comissões inverosímeis “saca” sem aviso da conta de um jovem a alimentação de uma semana. Não são censuráveis estes impostos ocultos e obscuros praticados para fazer uma Política de Redistribuição de Riqueza Inversa (à semelhança dos governos neoliberais de agora ou de há bocado): tirar, a quem tem pouco, muito!,  para distribuir pelos “nomeados” que, tendo muito, o que recebem é sempre pouco...
Quem põe cobro nestes roubos, nestas extorsões em massa, quem os leva a tribunal???


sábado, 1 de janeiro de 2011

O Lobbie da caridade

http://www.odiario.info/?p=972&print=1

Pobres dos pobres que são pobrezinhos…

Jorge Messias* :: 10.12.08
Jorge MessiasEntre os anos 80 e os anos 90 “a igreja, aliada às grandes fortunas, promoveu a fixação em Portugal de poderosos bancos de origem sobretudo espanhola que acabaram por dominar totalmente o mercado financeiro português. Eram formações de capitais com origem mista – laica e eclesiástica – que mergulhavam profundas raízes no mundo confessional das grandes Ordens canónicas tradicionais, na Opus Dei ou nas Fundações católicas e no próprio Banco do Vaticano cujos gigantescos capitais integram riquezas acumuladas desde os tempos arcaicos do Comércio e da Conquista.”
As altas esferas da sociedade arrastam-se pela lama. Em Portugal, subiu o pano e vêm à baila as fraudes e os escândalos que envolvem políticos e banqueiros. Também por cá como, aliás, no restante mundo capitalista, multiplicam-se como cogumelos as manobras tendentes a transferir para os mais pobres os custos da crise dos ricos, a concentrar as fortunas e a desferir golpes mortais nos sistemas sociais garantidos pela Constituição. São muitos os pretextos invocados mas o objectivo central dessas manobras é sempre a destruição dos direitos e das liberdades dos cidadãos e o encaminhamento para a área privada e lucrativa das instituições do Estado que deveriam garantir o serviço público.
Tudo isto é acompanhado pelo aumento dos impostos, pelo agravamento da taxa de desemprego, pela desagregação da rede de segurança social e hospitalar, pela anarquia e pelas exclusões conscientemente provocadas na área educativa, pelos cortes de verbas orçamentais cirurgicamente aplicados nas autarquias e pelos corrupios dos dirigentes que saltam das direcções dos partidos ou dos lugares nos governos para as administrações públicas e privadas, sabotam as instituições, engordam as suas fortunas e, depois voltam ao ponto de partida para logo recomeçarem o ciclo infernal. No caso português, destas manobras resulta o contínuo aprofundamento do fosso entre ricos e pobres e a destruição da economia e do tecido social. Estamos a assistir, em Portugal, a um verdadeiro golpe de estado palaciano desenvolvido a um ritmo alucinante.
“Caridade bem ordenada por nós é começada…”
Em termos de imagem, é a igreja católica portuguesa aquela que sai mais degradada desta corrupta situação social. A opinião pública pouco se choca com os escândalos financeiros que vão surgindo por toda a parte. Os portugueses têm consciência de que a actual classe política do arco do poder e o capitalismo em geral se caracterizam pela ganância, pela cupidez e pela ambição pessoal desmedida. Estes traços característicos do grande capital e de muitos políticos oportunistas não são novos, vêm dos confins dos tempos e estão espelhados nos sofrimentos impostos pelas tiranias às camadas populares.
A igreja católica e a sua hierarquia deveriam, em princípio, serem excepção a esta regra geral. Desde sempre, perante o povo, a instituição católica tem sistematicamente aparecido como «opção pelos pobres» que obriga a sua hierarquia a um voto de pobreza e lhe impõe o «anúncio» de alternativas e a «denúncia» da degradação e da imoralidade.
O que se vê é justamente o inverso.
A banca não consegue ocultar a sua ligação íntima à prática do crime. Multiplicam-se os casos de fraudes e falências fraudulentas, as afinidades do grande capital com os “offshores”, com a especulação imobiliária, com o mundo da política, com o crime organizado, com o comércio subterrâneo da droga, das armas, da exploração da mão de obra, da prostituição, com o branqueamento do dinheiro, etc., etc. A tudo isto - que implica miséria para os pobres e fortuna para os ricos e se pode exemplificar com factos e nomes concretos - a hierarquia católica dá a cobertura da sua mudez e os padres silenciam.
Poderá perguntar-se por que razão assim procede a igreja quando se torna evidente que a sua atitude provocará a destruição da sua imagem pública. A resposta é simples e pode fundamentar-se em realidades já largamente descritas por investigadores que se dedicaram e dedicam à revelação das relações ocultas entre as hierarquias religiosas e os interesses do grande capital. Diga-se, à laia de conclusão antecipada, que as práticas canónicas não só são afins das estratégias capitalistas mas estão em íntima identidade com os objectivos e métodos das plutocracias.

Escândalos da “democracia” capitalista…

Na década de 80, a adesão de Portugal à União Europeia foi o início da recuperação do grande capital monopolista que, a pretexto de uma ideologia (a «Europa sem fronteiras») fez alastrar a mancha das multinacionais, dos bancos gigantescos e dos capitais anónimos que subverteram as instituições da República e limitaram drasticamente a autonomia dos movimentos sociais. Foi a partir de então que se impôs um conceito ideológico mais alargado e dependente (a tese da «globalização») e se passou à fase imperialista do grande capital com a subordinação dos governos nacionais às imposições dos interesses financeiros da plutocracia mundial e com a entrega sistemática das áreas sociais à chamada «Sociedade Civil» dominada pelas forças obscurantistas, nomeadamente pelas redes caritativas da igreja. Em Portugal, foram principais responsáveis por essas tremendas mudanças os governos do PS e PSD e políticos como Cavaco Silva, Mário Soares, Jorge Sampaio, Durão Barroso e António Guterres.
Foram esses irredutíveis defensores do grande capital financeiro os grandes protagonistas das desnacionalizações, da absorção das empresas nacionais pelas poderosas multinacionais estrangeiras e da abertura ilimitada do espaço português aos grandes bancos multinacionais que, na sua esmagadora maioria, representavam o cruzamento dos capitais laicos e eclesiásticos. As primeiras consequência deste tratamento de choque produziram-se não apenas na banca e na área financeira ou económica mas, igualmente, a nível da educação, da saúde, da segurança social, das mutualidades, etc., áreas onde a hegemonia foi entregue pelo Estado à Igreja católica. Criou-se toda uma geração dos grandes senhores que hoje ocupam as principais empresas e os ministérios. Na gestão dessa operação destacaram-se vultos políticos e católicos bem conhecidos (padre Melícias, Maria de Belém, Vera Jardim, padre Maia, D. José Policarpo e muitos outros) que passaram a dirigir ou controlar importantes institutos sociais financiados pelo orçamento do Estado.
Nessa fase crucial (entre os anos 80 e os anos 90) a igreja, aliada às grandes fortunas, promoveu a fixação em Portugal de poderosos bancos de origem sobretudo espanhola que acabaram por dominar totalmente o mercado financeiro português. Eram formações de capitais com origem mista – laica e eclesiástica – que mergulhavam profundas raízes no mundo confessional das grandes Ordens canónicas tradicionais, na Opus Dei ou nas Fundações católicas e no próprio Banco do Vaticano cujos gigantescos capitais integram riquezas acumuladas desde os tempos arcaicos do Comércio e da Conquista.
Em meia dúzia de anos entraram de roldão em Portugal e aqui se instalaram bancos cuja enumeração exaustiva não pode caber aqui mas deve ser fundamentada com alguns casos concretos.
O grupo Bilbao/Viscaya fixou-se no nosso país em 1987 após se ter formado, na década anterior, a partir da fusão de dois bancos (o Bilbao e o Viscaya). É considerado como sendo o mais poderoso grupo bancário espanhol. Possui dezenas de pequenas e médias empresas industriais e é proprietário de vários outros bancos, tais como o Industrial de Bilbao, o Banco de Financiamento Industrial, o Banco da Corunha, o Asturiano do Comércio e Indústria, o Castelhano o Banco de Málaga, etc.
As operações de fusão do Bilbao e do Viscaya foram dirigidas pelo Opus Dei que desde 1960 penetrou nesta área da banca espanhola. Após o afastamento do cardeal Marcinkus e dos conhecidos escândalos do Banco Ambrosiano, o BBV foi um dos cinco grandes grupos financeiros mundiais chamado a gerir as finanças do Vaticano.
Grupo Banesto entrou em Portugal em 1987. Comprou uma seguradora (a Union y El Fénix ) e o Totta & Açores, após ter formado uma aliança com os Valores Ibéricos de José Roquete (OD). O «Banesto» tem profundas ligações ao Opus Dei e às famílias Garrigues e Taberner, pilares da Obra em Espanha. Outras ligações notórias relacionam o grupo com os Rockefeler, os Kenedy, a ITT, o Bank of America, o Chase Manhattan Bank, a General Electric, etc. Está no ramo bancário, na indústria e no comércio, na agricultura e na área social. Emprega mais de 50 mil trabalhadores. Em Portugal, constituiu a Sociedade Gestora de Participações Sociais, uma importante arma de intervenção no universo dos pequenos e médios investidores o que lhe dá acesso e influência entre as camadas da classe média alta.
Também em 1987, veio para Portugal o Grupo Hispano-Americano. A sua «casa mãe» foi o Banco Hispano-Americano fundado a partir dos capitais repatriados de Cuba e de outros países da América Latina pelas missões e fundações católicas da Companhia de Jesus e da Ordem Dominicana. Tal como nos casos anteriores, o grupo é dominado por uma família fortemente ligada ao Opus Dei, neste caso a família Urquijo. O grupo possui vários bancos controlados pelos Jesuítas que, no entanto, cederam um deles (o Banco Continental) à Ordem dos Dominicanos, abrindo assim um canal de ligação ao conjunto das outras formações do capital eclesiástico. É essencialmente uma instituição de crédito cujo principal objectivo é a partilha do mercado financeiro europeu. Com essa finalidade, criou uma “holding” (a Europartners) e ligou-se ao «Comerzbank» alemão, ao «Crédit Lyonnais» francês e ao «Banco di Roma» italiano, todos eles bancos relacionados com o Opus Dei e com o Vaticano. Em Portugal, é dono de um vasto leque de empresas do qual sobressai a SFAC – Sociedade Financeira para a aquisição de Crédito. Tem relações preferenciais com o grupo Benedetti/Amorim.
Grupo Benedetti/Amorim constituiu-se no nosso país através de uma associação milionária entre a Cofipsa do grupo Amorim, o grupo Albertos espanhol e o Banco Bilbao/Vizcaya e, naturalmente, com o Grupo Benedetti italiano. Desde a sua fundação tem revelado uma forte conexão de interesses com o BCP, o Grupo Suez, a Sociéte Générale de Belgique e o Bilbao Vizcaya, bancos com fortes ligações eclesiásticas. Tem grande penetração nos estados ex-socialistas do Leste europeu e domina o capital de fortíssimas multinacionais como, por exemplo, a Fiat, a Olivetti, a Mondadori, a Finanza e muitas mais. O grupo Benedetti possui igualmente dois jornais italianos de grande tiragem («L’Espresso» e «La Republica»). No campo financeiro português e tal como nos casos já citados de outros grupos, a Benedetti Amorim tem grande interesse pelo ramo do crédito, com destaque para o seu «Bank of Lisbon» e pela sua empresa financeira «Amorim – Investimentos e Participações».
A listagem dos grupos financeiros que invadiram Portugal nesse fatídico ano de 1987, era então Cavaco Silva primeiro-ministro, é praticamente interminável. Poderiam ser referidos os grupos Santander (Jesuítas e Dominicanos), o Deutsch Bank (Comissão de Gestão Financeira do Vaticano), o Grupo Sanpaolo (Confrarias e Misericórdias), o «Lobby da Caridade» (Cáritas, Misericórdias, Mutualidades, ONGs e IPSS, aplicações financeiras da Igreja), os espanhóis do grupo Central e do grupo March (caixas de aforro, família Urquijo, Companhia de Jesus), o todo-poderoso Grupo Opus Dei (rede de bancos eclesiásticos e laicos que fazem a aplicação no mercado dos fundos da Igreja e promovem a sua expansão) e um nunca mais acabar de instituições anónimas que alastram por toda a parte e dividem para reinar.
Todo este peso esmagador caiu sobre nós, o povo português.
Caridosa, a igreja apressa-se a abrir sucursais do banco alimentar que representa a versão revista e maquilhada das antigas sopas dos pobres: pobres dos pobres que são pobrezinhos! Mas, nos galarins do Poder os banqueiros de charuto e cartola continuam a cruzar-se com os bispos ou equiparados de longas vestes e com os políticos corruptos que alegremente saltam de poleiro em poleiro. E o governo de Sócrates, solidário, abre torneiras sobre torneiras do ouro que irá tapar os buracos deixados pela cupidez dos detentores das fortunas.
É preciso lutar. É preciso votar. É preciso mudar.

Bibliografia consultada:
A prodigiosa aventura do Opus Dei “ - Ruedo Ibérico
Relatórios, contas, gráficos e diagramas de empresas das “holdings”
“Malhas que o capital tece” - Edições “ Avante “
“Opus Dei“ - Editorial Notícias
Recortes de revistas e jornais
* Jorge Messias é amigo e colaborador de odiario.info"