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terça-feira, 8 de novembro de 2016

O 'PERES' e as letras miudinhas da 'apólice'

O 'PERES' e as letras miudinhas da 'apólice'

PROCIDADE

'PERES': PROGRAMA ESPECIAL DE REDUÇÃO DAS DÍVIDAS AO ESTADO

O que o estado apenas diz 'no fim'; as letras miudinhas do 'contrato de adesão'. Ou ainda e mais uma vez A majestosa igualdade das leis que tanto proíbe o rico como o pobre de mendigar nas ruas, de roubar pão ou dormir debaixo das pontes (Anatole France).

Que "O Estado não é pessoa de bem", de tão recorrente, já é mais um aforismo de que uma queixa. Mas o que vimos observando como comportamentos do "Estado" desde há um par de décadas coloca-o ao nível do mais desenvergonhado e desprezível salafrário.

Antes de Mais, por "Estado" entenda-se a Administração do Estado e da República, operada por humanos, por pessoas, uns/as eleitos/as, outros/as nomeados/as e outros/as lá colocados em contrato de provimento vitalício (os/as chamados/as funcionários/as").

No que toca ao que mais tarde viria a dar à luz à luz como 'PERES', o que o XX Governo anunciou, alardeou, propagandeou, foi uma medida de "perdão" Fiscal que permitiria regularizar a situação fiscal de devedores com perdão/redução de juros e custas e podendo fazer planos de prestações que poderiam chegar a 150 prestações mensais. Referindo expressamente que o dito plano se destina "às empresas e às famílias", o Governo deixava antever nesta distinção alguma diferenciação de tratamento susceptível de criar condições de igualdade material e efectiva, tratando de forma igual o que é igual e de forma diferente o que é diferente
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NOTICIAS

Governo anuncia novo perdão fiscal

dinheiro




"Empresas e famílias poderão, até ao final do ano, pagar as dívidas que tenham ao Fisco e à Segurança Social com perdão de juros e custas. Em alternativa poderão solicitar um pagamento a prestações também com redução de juros, anunciou o Executivo."



Ocupando-me das famílias, devo lembrar que há famílias com rendimentos globais anuais superiores a 50 mil euros e, no outra extremo, há famílias com rendimentos anuais inferiores a 5 mil euros. Basta ter em conta uma família onde apenas um dos membros do agregado trabalha e aufere o salário mínimo, ou famílias onde ambos os cônjuges estão desempregados e não auferem sequer subsídio de desemprego ou subsídio social de desemprego, para perceber como será difícil para muitas famílias atingir sequer os 5 mil euros anuais. E mesmo que as famílias tivessem dívidas fiscais na proporção dos seus rendimentos, o esforço de pagamento, seja a 'pronto pagamento', seja num plano de prestações, não é igual e muito menos proporcional. Uma família que tenha disponível um rendimento mensal de 500 euros, depois de atender ao imperativo categórico da pirâmide de necessidades de Maslow, não fica com dinheiro disponível sequer para "mandar cantar um cego", quanto mais para regularizar dívidas fiscais, pelo que de um governo socialista o que se esperaria seria um pacote de medidas com as tais diferenciações geradoras de igualdade material e não apenas e meramente formal. Ou, como se disse, tratar de forma igual o que é igual e de forma diferente o que é diferente, para dar a todos verdadeiras condições de igualdade.

No p.p. dia 4 de Novembro e depois do alarde e propaganda, promulgou-se o 'PERES' e um par de dias depois, Segurança Social e Finanças (AT) colocavam cartazes nos seus átrios que davam a conhecer as condições que através dele - 'PERES' - foram criadas para que as empresas e as famílias regularizarem as suas dívidas fiscais, e agora sim, aparece a verdade perversa da medida governativa ou as tais letras miudinhas):


A - Pagamento à cabeça de 8 %;

B - Plano de pagamento até 150 prestações, mas com o valor mínimo de 102,00 por prestação para as pessoas singulares; (logo, para as famílias),

CTabela de redução de juros e custas
 a) Até 36 prestações, redução de 80%;
 b) de 37 até 72 prestações, redução de 50%;
 c)  De 73 até 150 prestações, a redução é de 10%.

A - Pagamento à cabeça de 8 %...
       ... enfim, não seria por aqui que seria desferido um grave golpe na igualdade: 8% de uma dívida              de 5 mil euros seriam 400 euros, 8% de uma dívida de 500 euros  seriam 40 euros;

B - Plano de pagamento até 150 prestaçõesmas com o valor mínimo de 102,00 por prestação para as pessoas singulares (logo, para as famílias),

       ou seja, são mesmos 102,00 euros para as famílias com um rendimento mensal de 500 euros, ou         de 2 mil, ou de 5 ou 10 mil; sem se perguntarem como pode uma família - ou a tal pessoa singular - que dispõe de 500 euros mensais abrir mão, durante 5 ou seis meses, de 25% desse magríssimo rendimento, isto é, o valor de que mensalmente precisa para água, luz e gás, ou mais de metade do pouco que terá disponível para alimentação - e quem sabe se com filhos menores e em idade escolar - e ainda falta pagar o custo da habitação, pelo menos; e com a igualdade já ferida de morte, mais um golpe com  o quadro ou tabela das reduções de juros e custas, que decai na proporção inversa das mensalidades do plano:

C - Tabela de redução de juros e custas
 a) Até 36 prestações, redução de 80%;
 b) de 37 até 72 prestações, redução de 50%;
 c)  De 73 até 150 prestações, a redução é de 10%, 

Não há dúvida, a Lei trata todos por igual [3], seja qual for a sua capacidade de auferir rendimentos, seja qual for o seu extracto económico e social, seja qual for a sua capacidade de gerar/auferir rendimentos, esteja ou não desempregado, ou doente e sem rendimentos. 

Se por um lado esta é mais uma medida do já tradicional socialismo equalitário de António Costa (enfim, tal como na estória do escorpião, é da sua natureza), por outro lado esta medida é uma descarada e incontornável manifestação da desonestidade do "Estado" e mais particularmente, das Finanças e da Administração Fiscal". 


Senão, vejamos,

- entre metade e dois terços das dívidas fiscais são criadas pelos e nos serviços fiscais, na forma de coimas, juros e custas convertidas depois em processos (execuções) fiscais por funcionários que dispõem de um poder igualável ao de juízes de Direito,


- e houvera uma justiça fiscal (Tribunais Administrativos e Fiscais) minimamente célere e garantística, o que o fisco reclama como dívidas seria reduzido a pouco mais de um terço;


- A mesma administração fiscal que gera e gere as alegadas "dívidas", tem em seu poder e sem trabalho nenhum [1] as declarações anuais de rendimentos de todos os cidadãos e agregados (ou das famílias),


- assim como tem em seu poder a informação sobre o património - sobretudo imobiliário - das mesmas famílias,


- e cruza ainda quando, como e com quem quer, e como quer, as informações que bem entende;


Tem, em suma, a informação mais que suficiente para saber quem deve e quanto, porque deve e que condições tem para pagar. Não é o Registo Civil que tem esta informação; ou tampouco a Câmara Municipal; quem dispõe de toda esta informação - e obrigatoriamente escriturada nas Plataformas electrónicas da AT pelos próprios contribuintes [1]  - são as Finanças, é a administração fiscal, é a AT;



Então, a AT/administração fiscal tem todos os dados necessários para fazer com cada pessoa singular, com cada família, e para cada um/cada uma, um plano prestacional à sua medida, ou à medida dos seus rendimentos e ou riqueza, de forma a que a todos fosse permitido, sã, honesta, equalitária e equitativamente,  proceder à regularização da sua situação fiscal.

Assim, graças ao efeito retorcido de uma tão clara e democrática medida, quem vai poder regularizar a sua situação fiscal, serão apenas os quem ganhando o suficiente para não terem dívidas ao fisco, ainda assim não pagaram, porque deram prioridade às prestações do BMW, ou a umas quantas viagens aos trópicos, E continuarão devedores - e condicionados nos benefícios sociais pela situação não regularizada - aqueles que não pagaram porque não tiveram - e continuam a não ter - as condições financeiras para pagar o que lhes é exigido e nos prazos e montantes que lhe são exigidos [2].


Y que vivan el Señior Costa, El Señior Peres y la democrácia nominal, pués...


[1] - Nos últimos 15 anos a AT (o "Estado") transferiu para os contribuintes a obrigação de escriturar toda a informação fiscal que antes era operada - como devia ser! - pelos funcionários administrativos. Desde o preenchimento na "plataforma" de todas as obrigações declarativas até ao carregamento da informação a cruzar nas bases de dados (a comunicação das facturas, guias de transporte, etc.), passando até por coisas como o registo pelo próprio contribuinte de contratos de aluguer, todo este trabalho (entre 70 e 90% do trabalho de escrituração), outrora escriturado pelos funcionários, é hoje escriturado pelos cidadãos, que assim foram constituídos empregados da AT, em regime de voluntariado obrigatório (não remunerado, obviamente) e que trabalham para a AT à noite, em casa ao serão ou ao fim-de-semana e quem não sabe ou não pode, que pague a alguém para escriturar por si.
Contudo, as repartições )agora chamadas "Serviços" aumentam de dimensão e o número de funcionários não diminuiu, pelo contrário. O que fazem ou de que se ocupam então agora os funcionários "residentes" da AT?...

             - Geram e depois gerem dívidas fiscais, execuções e penhoras; as repartições ou "serviços" foram "reconvertidas" para esquadras ou divisões da coercividade fiscal...

[2] - Aliás, para estes contribuintes, ou estas famílias,  o 'PERES' veio até criar condições mais exigentes e mais dificuldades, ao fixar em 102 euros a prestação mínima, limite que não existia antes de 'PERES' e que permitia planos de 10 ou 12 prestações que poderiam ser de valor inferior aos famigerados 102 euros, critério valorimétrico que o 'PERES' foi copiar ao Código das Custas Processuais (102,00 €=1 UC), mal-disfarçando a vocação judicialista das "finanças";

[3] - Em bom rigor nem é verdade, a Lei (o OE2017/PERES) faz algumas diferenciações ou discriminações positivas. Mas imagine-se para que entidades: para as empresas!

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